Eu pensei que tinha deixado meu
chapéu ao lado do Tibira, mas não... Como vou fazer agora para juntar as
esmolas do semedão diário? O Tibira não consumiu com ele. Foi aquela jeitosa da rua de cima que me deu
o chapéu e me é de boa serventia, o cristão não pode pregar os olhos um
instantinho que já vem um sete-pele pra acabar com a paz do pobre. Pelo menos,
o semedão já tava aqui no bolso da japona. Tibira nem latir, latiu. Deve ter
sido o vento que levou o meu chapéu pra conhecer outros pensamentos talvez um
pouco mais arrumados do que deste velho combatente ainda em prumo.
Vou contar agora todo esse
semedão, mas tá forte esse vento, as pratinhas ficam, mas estas notas amassadas
podem sair voando nessa onda cheirosa do feijão da Janira Rabuda que ainda deve
ter apesar do adiantado da hora. Quatro e cinquenta, cinco. Agora juntando
essas pratinhas vamos chegar aos sete e cinquenta do pê-éfe do bar do Ataulfo.
Ah, Janira... Vou comer teu feijão hoje de novo. Bem misturado com o arroz e a
farinha. Isso é que importa. O de resto, nem sei. Se for galinha, dou o osso
pro Tibira. Se for porco, também. Carne assada, separo um pedaço pra ele. Mas,
seu feijão, Janira, seu feijão é todinho meu.
Tem dias que o semedão é
senumdão e eu suporto a fome até a noite. Mesmo há três anos mendigando, ainda
não consigo dormir de estômago vazio.
Costumo ir até as lixeiras perto das lanchonetes mais famosas e reviro.
Como os restos. Quando não acho restos, como o papel dos sanduíches. É bom
porque aí eu cago embrulhado no dia seguinte. Na rua mesmo. De preferência na
rua em que botaram flores para vender e tiraram os mendigos que lá estavam.
Espalharam a gente pelo bairro. É que concentrado fica mais feio. Quando é um
ou outro dá pra virar a cara e fingir que não está vendo. Mas, uma colônia de
mendigos, a prefeitura teria que tomar alguma medida. E tomou: botou um
comércio de flores no lugar em que estávamos e escondeu sua omissão e
incompetência.
O que tenho aqui são nove
reais. Se o Ataulfo estiver de bom humor ainda posso tomar uma branquinha. O
dia foi bom. Vou aproveitar e olhar debaixo das rodas dos carros para ver se
meu chapéu não voou para lá. Tem que ser antes de comer, porque depois desse
feijão dá uma preguiça...
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